Terra
Aos 83 anos, o comediante mexicano Roberto Gómez Bolaños, famoso pelas séries Chaves eChapolin,
não contava com a astúcia do público que conquistou. Transformado em
ator consagrado com 40 anos de carreira, ele recebeu uma emotiva
homenagem preparada por milhares de fãs, amigos e familiares na Cidade
do México, nessa quarta-feira (29).
O evento contou com números musicais, esquetes e a participação de
companheiros de elenco como Edgar Vivar (Senhor Barriga) e Ruben Aguirre
(Professor Girafales), que relembraram o legado do artista. Bolaños
chegou ao palco de cadeira de rodas uma hora depois do previsto, devido
ao seu delicado estado de saúde.
A dificuldade para caminhar não o
impediu, no entanto, de se emocionar com a receptividade de uma plateia
que o aplaudiu de pé, nem de fazer graça quando sua esposa Florinda
Meza, a Dona Florinda, sentou-se ao seu lado em um sofá colocado em
frente ao palco. Era o primeiro indício de que seria uma tarde
tipicamente mexicana, com alegria e drama.
Bolaños acompanhou apenas duas das mais de seis horas de gravação, e
com um tubo de oxigênio ao lado, mas a imagem distante à do personagem
vigoroso da televisão também era um lembrete de que o tempo passa para
todos e uma prova de que o talento do comediante ultrapassa gerações.
Muitas horas antes do início, na porta do Auditório Nacional, local do
evento na capital mexicana, bebês e crianças fantasiadas pelos pais se
misturavam a uma paisagem de adultos que cresceram vendo Chaves e Chapolin.
Em meio a uma fila que dava voltas, Maurício Melo, de 31 anos, Diego
Fernandez, de 29, Ricardo Manfredini, de 28, e Felipe Araújo, de 31,
agitavam uma bandeira verde e amarela. Integrantes do fã-clube
Chespirito Brasil, eles viajaram ao México só para assistir à homenagem.
Em vez de incluir tequila e mariachis no itinerário da visita, eles
preferiram um “turismo temático”. Conheceram o cemitério onde está
enterrado Ramón Valdéz, que interpretava o saudoso Seu Madruga e, no dia
seguinte ao show, planejavam conhecer Acapulco, balneário visitado por
toda a vizinhança de Chaves em episódios emblemáticos.
“Chaves é o maior show de todos os tempos. O programa faz
rir sem apelar, tem um roteiro muito bom e não à toa é um sucesso há 40
anos no Brasil”, afirmaram. Dentro do Auditório Nacional, sentados na
primeira fileira, os brasileiros fizeram festa e até foram incentivados a
sambar pelo apresentador da homenagem, Marco Antonio Regil.
“É emocionante. Esperei anos para estar nesta homenagem”, diz
Maurício. Vários fãs de fora do México acompanharam a homenagem. Muitos
presencialmente, outros de seus lugares de origem em conexões feitas com
canais de televisão de países como Peru, Argentina, Estados Unidos,
Guatemala, Honduras, Uruguai e Colômbia. No total, 17 países
participaram da programação, que será transmitida em março.
Outros fãs registraram em vídeo suas histórias de superação, em que a
admiração por Bolaños e os personagens criados por ele deram ânimo para
vencer uma dificuldade em suas vidas. Em outro momento do show, fãs de
dez países, inclusive o Brasil, disputaram um teste de conhecimentos
sobre os personagens e os atores de Chaves. A representante da
Argentina, Paulina, venceu a disputa. Mas o Brasil não saiu sem troféu. O
País foi escolhido por Florinda Meza, Edgar Vivar e Rubén Aguirre para
receber o prêmio de melhor coreografia em um evento convocado em meados
de fevereiro e gravado em vários países da América Latina. Brasileiros
fantasiados, claro, dançaram uma canção do seriado a ritmo de samba em
pontos turísticos de São Paulo.
Já as atrações musicais ficaram por conta de artistas como Pandora, OV7 e Armando Manzanero, que dedicou ao piano a música Somos novios a
Bolaños e Florinda, além de Thalia e um belo momento protagonizado pelo
mexicano Juan Gabriel, que cantou vestido com as cores do Chapolin
Colorado e acompanhado de um coro de mariachis.
Até os jogadores do América do México, time de futebol ao qual pertence o personagem de Bolaños no filme El Chanfles, subiram ao palco para homenagear o ator, que recebeu uma camisa com o nome Chespirito (apelido
dado como diminutivo de Shakespeare). Enquanto o telão passava os gols
do personagem no filme, Bolaños avisava pelo microfone: “esses gols fui
eu mesmo que fiz”.
Te quiero (em português, te amo), ao lado de Gracias (em
português, obrigado) foram as frases mais repetidas por ele em
agradecimento a quem dedicava um número ou palavra de carinho. Antes de
deixar o evento por recomendação médica, o comediante mexicano se uniu
aos companheiros de elenco para uma foto que há tempos não se
registrava. O público pôde escutar Ruben Aguirre (Professor Girafales),
entoar seu famoso bordão “tá tá tá tá tá”.
Também se surpreendeu com a energia de Florinda Meza (Dona Florinda),
que se misturou com a “gentalha” e interagiu bastante com a plateia. E
ainda viu Edgar Vivar (Senhor Barriga), atribuir em tom de brincadeira
que sua aparência bem mais magra se devia ao fato de que “ninguém paga o
aluguel”. Ele elogiou o público brasileiro ao Terra e disse, em ótimo português, que possivelmente visitará o Brasil no início de abril.
Faltou a sonhada reconciliação com Carlos Villagrán (Quico), e María
Antonieta de las Nieves (Maria Chiquinha). Os atores não eram esperados
na homenagem, devido a antigas desavenças que os levaram a romper
relações com Bolaños. A quantidade de pessoas com fantasias de todos os
personagens, porém, demonstra que no imaginário público ficou marcada a
ideia de um grupo unido no objetivo de fazer rir com um humor simples,
inocente, quase sem querer querendo.