“Estabelecer critérios comuns entre as centrais sindicais
torna-se fundamental para fortalecer os sindicatos e garantir a luta dos
interesses dos trabalhadores”. Foi com esse objetivo que em fevereiro
deste ano a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB)
iniciou a campanha para esclarecer a discussão sobre a dicotomia
unicidade sindical/pluralidade sindical.
Por Joanne Mota*
De acordo com a base teórica da CTB,
a atual correlação de forças no interior da sociedade brasileira e
mundial, com a ampla ofensiva do capital financeiro, exige um novo
projeto nacional de desenvolvimento que tenha como alicerce a
valorização do trabalho, a unidade dos trabalhadores e o fortalecimento
das instituições. Esse posicionamento não é novo, desde 2003 as centrais
empreendem ampla negociação para atingir tais objetivos.
Em 2010, durante o Congresso da Classe Trabalhadora (Conclat), as
centrais definiram ampla agenda, na qual ficou especificado que uma das
bandeiras para garantir o papel protagonista dos trabalhadores seria a
unidade.
“Naquele momento definimos como uma das metas essenciais a consolidação
da unidade dos trabalhadores como vetor para a elevação do protagonismo
da classe trabalhadora na luta pelo fortalecimento da política nacional.
Já está comprovado que as centrais sindicais desempenham um
significativo papel neste sentido, e a unidade de ação que construímos, e
agora fortalecemos com a campanha da unicidade, está calcada na
mobilização e esclarecimento da base e na legitimação das entidades
sindicais. Desse modo, acredito que influenciaremos ainda mais no
processo de mudança do nosso país”, explicou a Visão Classista o
presidente da CTB, Wagner Gomes.
Segundo ele, as entidades que defendem a unicidade sindical se
contrapõem ao posicionamento “defendido pelo liberalismo burguês, que
permitiria ao trabalhador escolher o sindicato de sua preferência, de
acordo com sua própria orientação política e ideológica”.
O secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves (Juruna),
explicou que do ponto de vista ideológico essa discussão abre duas
frentes, uma individualista e outra coletiva (classista) de encarar a
organização sindical.
“A opção individualista está ancorada, desde a época da Revolução
Francesa (quando os sindicatos começaram a ser organizados), na ênfase
de uma relação contratual, na qual patrão e empregado seriam atores
movidos apenas por sua vontade individual soberana e pela defesa de
interesses particulares. A ação sindical vista assim deixa de ser um
direito e transforma-se num serviço. E o trabalhador, nessa relação,
perde a cidadania e veste a máscara do consumidor”, alertou Juruna.
Já a opção coletiva – classista -, versa sobre os interesses dos
trabalhadores e o conflito fundamental entre o capital e a força de
trabalho.
“Esta concepção considera os trabalhadores em seu conjunto. Neste
sentido, a tradição operária aponta para a busca e construção da unidade
de ação, ou seja, para a unicidade sindical frente à pluralidade. A
defesa e manutenção dos sindicatos é, ao olhar dos que defendem a
unicidade, uma tarefa da classe trabalhadora em prol de seus
interesses”, ratificou Juruna.
Sindicato Forte é sindicato com representatividade
Lourenço Prado, coordenador nacional do Fórum Sindical dos Trabalhadores
(FST), reafirma que a unicidade se impõe acima de tudo porque ela se
configura como uma coisa coletiva, ou seja, ela fala em nome de muita
gente. Enquanto que a pluralidade é uma coisa muito individualista e de
cunho neoliberal. E é, sobretudo, por este último que a unicidade
sindical precisa se manter.
“É preciso lembrar que mesmo com a vigência da unicidade assegurada pela
Constituição, o movimento vive hoje uma verdadeira bagunça sindical. Ou
seja, presenciamos a criação aleatória de sindicatos sem
representatividade. Esse movimento enfraquece a luta. E por que isso
acontece? Debito essa bagunça sindical ao enfraquecimento do Ministério
do Trabalho, que durante anos serviu apenas para registrar sindicatos e
não como órgão mediador, fiscalizador e regulador do setor”, elucida o
coordenador do FST.
Segundo ele, “um dos caminhos para se garantir a unicidade e assim
acabar com essa bagunça sindical é o fortalecimento do Ministério do
Trabalho. Questiono: Por que quando realizamos alguma negociação, esta
deva ser feita com a mediação do Ministério da Fazenda e não com o do
Trabalho? Somente isso já responde o cenário que vivemos e o quanto
ainda precisamos caminhar para atingir um ambiente mais justo. E nesse
caso, a meu ver, a unicidade é o caminho”.
Lourenço, que também é presidente da Confederação Nacional dos
Trabalhadores nas Empresas de Crédito (Contec), ainda frisou que o novo
ministro do Trabalho, Brizola Neto, durante sua posse, salientou que é
chegada a hora de se repensar o papel do Ministério que hoje se
configura apenas como um cartório.
“É preciso colocar o MTE como protagonista e não coadjuvante nos
processos de negociação dos trabalhadores. O ministério precisa assumir
seu papel nas negociações e não apenas registrar sindicato. Uma questão
que é preciso ser citada, é que o novo ministro já sinalizou que a
Portaria 186, que possibilita a proliferação dos sindicatos, possui um
texto muito subjetivo. Essa subjetividade faz com que cada um interprete
a sua maneira, que gera o ambiente que temos hoje. Então, se o novo
ministro já percebeu essa nuances e assumiu que o ministério deve ser
re-aparelhado, penso que estamos em um novo caminho, no qual a unicidade
tem muito a ganhar”, finalizou o dirigente.
Liberdade sindical: mais um canto de sereia?
Nivaldo Santana, secretário Nacional Sindical do Partido Comunista do
Brasil, disse a Visão Classista que não é por acaso que diversos
pensadores têm publicizado suas opiniões em torno da discussão da
campanha pela unicidade sindical, e que traz consigo a defesa da
contribuição sindical.
Segundo ele, esses posicionamentos são construídos a partir dos
interesses das forças conservadoras. “O que temos é um ideal forte,
classista e que busca garantir desenvolvimento com valorização do
trabalho de um lado, e do outro, um sindicalismo de serviços, onde o
associado optaria pela entidade que melhor prestasse atendimento, ou
ainda o que dispusesse da melhor colônia de férias, ou um amplo porfólio
de serviços para mitigar as agruras do cotidiano do trabalhador. Ou
seja, esta última passa longe da nossa posição, a qual está preocupada
com o fortalecimento do sindicalismo classista, democrático e de luta
contra a exploração capitalista”, reflete.
Nivaldo Santana, que também é vice-presidente da CTB, acrescenta que
esse posicionamento conservador coloca para o trabalhador uma falsa
liberdade. “A unicidade sindical se opõe ao canto conservador, ela busca
garantir a existência de um sindicato único na mesma base territorial,
com a preservação de suas fontes de custeio, dentre as quais a
contribuição sindical, conforme determina o artigo 8º da Constituição
Federal”, afirma o dirigente.
Pascoal Carneiro, secretário-geral nacional da CTB, acrescenta que o
fortalecimento dos sindicatos passa pelos seus princípios de unidade com
liberdade e autonomia, baseados na unicidade sindical. Ele explica que
com a Constituição de 1988, “os trabalhadores avançaram nesta conquista,
rompendo com a estrutura ministerialista, com o estatuto padrão e
ampliaram os direitos trabalhistas, estendendo-os aos trabalhadores
rurais, legalizando a organização sindical dos trabalhadores no serviço
público e proibindo a intervenção do estado nos sindicatos”.
Ser contra imposto é ser contra os trabalhadores
“A campanha contra o imposto sindical é muito oportunista e não é a
melhor ação para quem se propõe advogar os interesses dos
trabalhadores”. Foi como resumiu a Visão Lourenço Prado, ao se
posicionar em relação à campanha contra o imposto sindical.
Segundo ele, “é incoerente este posicionamento, qualquer um que avaliar
percebe a inviabilidade desta campanha. E aí eu pergunto: Sem imposto
sindical, como os trabalhadores poderão organizar suas campanhas,
garantir suas bandeiras e fazer frente ao patronato?”
Wagner Gomes elucida que na atual conjuntura, a campanha da Central
Única dos Trabalhadores (CUT), por exemplo, foi um grave erro histórico,
pois desvia a atenção dos trabalhadores das questões principais da
pauta nacional e elege como prioritário um tema que, além de secundário,
divide e enfraquece os sindicatos.
“Nossa expectativa é que os dirigentes cutistas façam uma reflexão
crítica e autocrítica sobre o assunto e tenham a sensatez de compreender
os prejuízos políticos que a ênfase na ação diversionista causa ao
sindicalismo nacional e à classe trabalhadora. Queremos a CUT ao lado
das outras centrais na árdua batalha para concretizar a agenda da
Conferência Nacional da Classe Trabalhadora (Conclat)”, frisa o
presidente da CTB.
Papel dos sindicatos
Para as centrais o verdadeiro papel dos sindicatos vai além da defesa
dos interesses imediatos dos trabalhadores (salários, condições de
trabalho, duração da jornada de trabalho, etc). Os sindicatos,
sobretudo, servem para formar cidadãos e estabelecer a coesão dos
trabalhadores em defesa de seus interesses. Seja na vitória de suas
bandeiras, seja na participação direta na construção do país.
Juruna afirma que a estrutura sindical tem contribuído muito para as
lutas dos trabalhadores, esse cenário deixa claro a importância de se
garantir, na base, um sindicato unitário. “Graças ao movimento sindical
90% dos acordos coletivos firmados foram negociados pelos sindicatos e
conseguiram garantir aumento real nos salários, além disso, é bom
lembrar que o Brasil possui um índice de sindicalização superior ao da
Europa. Tais fatores só reforçam nossa luta pela unidade dos
trabalhadores no sindicato”, explica o dirigente.
Nivaldo Santana lembra que o Brasil vive um período sem paralelo na sua
história republicana. “A terceira vitória consecutiva das forças
progressistas, com a eleição de Dilma Rousseff, teve no movimento
sindical unificado um ator de primeira grandeza. Para o sindicalismo
continuar a ser protagonista, as centrais precisam apostar na luta e na
unidade. Este é o maior desafio para o aprofundamento do projeto
nacional de desenvolvimento com valorização do trabalho”, reafirma.
O coordenador da FST, Lourenço Prado destaca disse não ter dúvidas do
papel do movimento sindical na história. “Enfrentamos ditaduras,
participamos de uma constituinte, elegemos um metalúrgico e uma mulher
para a presidente. Porém, como em muitos setores temos problemas e
precisamos saná-los. Penso que a formação de quadros é o caminho,
construir politicamente o ambiente sindical, dotar o trabalhador de
armas fortes para a disputa na arena política. E a unicidade sindical é
uma das trincheiras que favorecerá essa preparação”, justifica.
Nesse sentido, diz Wagner Gomes, “os sindicatos servem para garantir a
regulação da ação do capital, o estabelecimento de leis de proteção
contra a ganância do lucro máximo e, em última instância, o despertar
dos trabalhadores para novas formas de sociabilidade que superem as
limitações do grosseiro economicismo vigente na sociedade capitalista e
garanta que o sujeito-cidadão influencie diretamente no destino de sua
nação”.
Campanha da Unicidade: primeiros resultados
Eduardo Navarro, secretário Nacional de Comunicação da CTB, destacou que
defender a unicidade sindical é defender os interesses da classe
trabalhadora. “Desde os primórdios do capitalismo, com seu nível brutal
de exploração, que os trabalhadores desenvolvem as mais diversas formas
de luta de resistência, ora para reduzir a jornada de trabalho ou
melhorar o salário, ora para combater o próprio capitalismo. Em todos
estes momentos a luta exigiu a unidade entre todos os trabalhadores para
enfrentar a violência do capital. Nesse sentido, diferentemente de
alguns segmentos, entendemos a unicidade pode ser entendida como cimento
para a luta dos trabalhadores”.
No que se refere à campanha iniciada em fevereiro, o secretário destacou
como positivo os resultados até o momento alcançados. “A campanha
conseguiu abrir o debate sobre o assunto no meio do movimento sindical.
Os sindicalistas já ouvem a mesma pregação sobre liberdade sindical há
30 anos, de forma limitada e parcial. Com essa campanha nós apresentamos
ao público argumentos sobre o verdadeiro sentido da liberdade de lutar,
mostrando a importância da unidade dos trabalhadores e os interesses
que se escondem por traz de um discurso liberal”, esclareceu.
Segundo ele, a primeira etapa da campanha de divulgação nacional já foi
atingida. “Após o primeiro momento, com a campanha nacional, chega a vez
das seções estaduais e dos sindicatos repercutirem a campanha em suas
regiões. Nesse sentido, a veiculação de materiais, realização de debates
sobre o tema e, o mais importante, com o contato direto com os
trabalhadores na porta de fábrica, nas lojas, nas agências para tirar as
dúvidas de qual o melhor modelo de sindicalismo o país precisa são
ações condicionais para ampliar o entendimento do que realmente está em
discussão neste tempos”.
*Publicado originalmente na Revista Visão Classista.